Sinta-se Mormaii
Publicado em 04/04/2016

A primeira vez a gente nunca esquece-Rally-Alexandre Durigan

Sempre acompanhei o Rally dos Sertões. Uma grande prova de resistência e superação onde temos que 

desafiar nossos limites!

Sempre acompanhei na “garupa” os vários amigos que participavam. Sonhava um dia em estar lá ao lado daqueles grandes pilotos que sempre admirei, mas, considerava quase impossível devido aos altos custos de uma moto importada, dos equipamentos, dos apoios, da inscrição e de tudo mais que é necessário. A conta era alta para uma pessoa que não tinha grandes sobras financeiras e eu temia que no dia que tivesse dinheiro para participar talvez eu não tivesse mais idade nem condições físicas para tal. 

Para minha supressa, no dia 21 maio de 2015 um anúncio da DUNAS me tirou o sono: nova categoria CRF 230. Já pensei que os custos seriam menores. No mesmo momento comecei a fazer ligações e articular a realização da minha sonhada participação. Nessa hora começou a batalha e o desafio de barreiras, pois de imediato muitos me chamaram de louco, mas segui em frente me concentrando nas pessoas que me apoiavam.

Tive a sorte de um amigo, Rodrigo Vendramini, ir aos Sertões e com ajuda de Luiz Racing fiz uma proposta para entrar na equipe. Após duas longas semanas sem dormir e correndo atrás estava concretizada minha participação no Rally dos Sertões 2015 de CRF 230. Onde o único objetivo era terminar com segurança.

Nesse momento começou o apoio de muitos amigos virtuais e reais. O mecânico Luiz Racing alugou-me uma moto já preparada, pois eu não tinha a moto. O equipamento de navegação foi todo emprestado pelo amigo Cristiano Teixeira, que participou em 2012. Tive ajuda financeira através do Junior Calixto, do Theseu da Mormaii, do André Lago da FW Performance e do “Bissinho” que me deu orientações. Com todas estas contribuições o projeto cresceu tornando-se cada vez mais real. 

Intensifiquei os treinos físicos e com moto. Saía pelas estradas da região onde moro, as quais conheço bem, para ficar o máximo possível em cima da moto rodando de 200 a 400 km por dia nos finais de semana. Tudo era feito com a moto e por terra, até a ida para casa da minha namorada em Catanduva (74 km) era feita por terra. Fazia bate volta só para rodar.

Nunca havia navegado e o amigo Bissinho fez uma planilha para mostrar como seria o Rally. Foram longos 60 minutos para percorrer 25 km. Foi ali que pensei… Ferrou! Mas não abaixei a cabeça e sabia que iria superar isto. Dia 29 de julho partimos para Goiânia já em clima de Rally. Começou o “frio na barriga”. Já estávamos na competição e eu era o piloto número 40 da 23ª Edição do Rally dos Sertões. Começaram a aparecer os torcedores e amigos visitando e apoiando. Quando viam um cara de 1,88 metros de altura com 108 kg em uma CRF 230 vinha à clássica pergunta: – “Será que você termina?”.  A resposta sempre foi firme: – “Sim! Eu vou terminar.”

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Alexandre Durigan no Prólogo do autódromo de Goiânia (GO). Créditos da foto: Marcelo Maragni.

Vistoria técnica, Prólogo, o Rally já havia começado. No domingo era a largada e, eu ansioso, não dormi.  Às 6h da manhã estava pronto. Parti em deslocamento para a primeira especial e foi quando caiu a “ficha”. Eu estava fazendo história mostrando para muitas pessoas que sim, é possível, realizar um sonho. Meu objetivo sempre foi só terminar independente do tempo e resultado.

Após a largada acho que os primeiros 50 km, nem me lembro direito, foi uma pilotagem como se fosse para conquistar um título, na “ponta dos dedos”, e bingo! Eu estava conseguindo navegar meio sem jeito, mas estava acertando o caminho. A dúvida era acelerar e se arriscar ou não acelerar e deixar os UTVs chegarem. Passados 150 km chega o primeiro UTV e o susto foi grande. Mantive-me firme e tentei não perder concentração para terminar a prova. Faltando 1 km e 11 minutos para estourar o tempo não teve como conter a emoção e veio o choro. Eu acabava de terminar minha primeira especial do Rally dos Sertões. Fiz um vídeo e compartilhei no Facebook para dividir com meus amigos. Antes era eu na “garupa” desta vez era eu levando muita gente. Sendo assim, me senti no dever.  O primeiro dia foi uma grande vitória, mas mantive a calma já que havia mais seis dias.

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Alexandre Durigan no último especial do Rally (trecho entre Umuarama – PR e Foz do Iguaçu – PR). Créditos da foto: Marcelo Maragni.

Já no segundo dia, parti com novo objetivo: terminar e não estourar o tempo máximo de prova. Com isto, a navegação foi se aprimorando.

No terceiro dia veio a “paulada”. Começava literalmente o Rally: 527 km de muita navegação, areia e curvas. Logo no começo da especial vi o helicóptero de resgate e uma moto no chão. Ali me dei conta de que o piloto que cai dificilmente levanta para continuar. Os tombos são sempre “feios”. Tive certeza de que não podia me empolgar. No final da especial o lugar era travado com muita areia, um show para pilotagem. Neste momento veio o segundo alerta: um quadriciclo estava pegando fogo. O tanque havia explodido atingindo o piloto. Mais um grave acidente evidenciando o porquê deste Rally ser o segundo mais difícil do mundo. Após 73 km terminei o dia com mais uma grande vitória pessoal. Havia terminado o dia mais longo do Rally e tinha vários amigos no final da especial esperando para comemorar. 
Quarto dia, mais 430 km, que se resumia em areia, areia, muita areia e navegação. A 230 sofreu e eu também. Era dia de dar uma boa revisão na moto já que no final do próximo dia seria a etapa maratona: um dia do Rally em que a moto fica no parque fechado e só o piloto pode dar manutenção. No quarto dia a confiança cresceu. Acabava de passar da metade, estava me sentindo ótimo, já me sentia um vitorioso e estava orgulhoso de mim mesmo. 

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Alexandre Durigan no Trecho Especial (entre São Simão – GO e Três Lagoas – MS). Créditos da foto: Vinicius Branca

Quinto dia, mais um dia pesado, com muita areia, navegação e muita atenção.  Dali para frente era manter o ritmo para chegar à Foz. Um fato engraçado que vinha acontecendo e se repetiu neste dia foram os pedidos para tirar fotos vindos dos moradores das regiões por onde o Rally passava. Nem sempre quem está pelo caminho entende como é o Rally. Os ponteiros estão na disputa e não podemos se dar ao luxo de parar para u
ma foto. Eu resolvi atender aos pedidos. No meio de uma fazenda vi uma moça fazendo sinal de “pelo amor de Deus” pedindo para que eu parasse para tirar foto. Era uma zona de radar (trecho que cruza zonas de perigo em baixa velocidade) por isto, atendi ao pedido. O seu olhar de gratidão não teve preço. Ela agradeceu inúmeras vezes. Expliquei que é uma competição e que poucos vão parar para tirar fotos, sorri e parti. Mais adiante, para minha surpresa, em um vilarejo (outra zona de radar) inúmeras pessoas pediram novamente. Eu prontamente parei. Uma mãe colocou o filho na moto e a máquina ficou sem pilha. Ela correu na vizinha e pediu para ela vir fotografar com o celular. Ela gritava: – “Moço! Moço! Pelo amor de Deus! Espera 1 minuto. Você foi o único que parou.”. Eu dei risada e me senti o embaixador do Rally junto à população. Modéstia a parte me sentia “o piloto”. Considero isso muito importante. Somos nós quem transmitimos a imagem do Rally ao público. Esses ocorridos me enchiam de orgulho. 

Outro fato muito engraçado era a turma do fundão do Rally. De vez em quando havia alguém com a planilha quebrada, seguindo outro piloto que estava navegando, quando ele se anima, encontrando o caminho, ia embora. De repente, lá no estradão você encontra com ele passando reto pela referência e voltando andar atrás de você. O pessoal que está perdido vai andando junto. Na verdade, a turma do fundão virou uma festa porque ali ninguém está competindo, o pessoal está apenas se divertindo. Então, se torna muito engraçado. 

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Alexandre Durigan no Trecho Especial (Rio Verde GO – Itumbiara – MG).

Os dias eram muito corridos. Largada às 5h30min/6h00min chegávamos 15h00min/16h00min, pegávamos a planilha do dia seguinte, íamos almoçar e tomar um banho. Logo já estávamos marcando planilha para ir para o briefing, voltávamos, revisávamos a planilha e uma geral na moto. Após o mecânico revisar dávamos atenção ao pessoal que vinha visitar e matar a curiosidade com a CRF 230, jantar, ajudar a equipe a organizar e pronto já eram 23h00min. Lá se ia mais um dia. O jeito era descansar para a próxima batalha. 

O clima do Rally é grandioso. É muito satisfatório viver aquele mundo. Ver pilotos desistindo da prova mostra o quanto o Rally é duro. Recebi mensagens de pessoas que já haviam participado 4 ou 5 vezes e nunca haviam terminado e eu estava ali na minha primeira participação vencendo um dia após o outro. Nunca fui melhor que ninguém, mas me senti orgulhoso em superar meus limites. Minha estratégia estava certa. Claro que ir para ser vitorioso aumenta os riscos e isso muitas vezes não nos deixa terminar.

Chegava o tão sonhado último dia. Outra noite sem dormir. O clima era festa. Nos últimos 350 km foi como um desfile para mim: acenava para todos, tirei fotos com todos que pediram para tirar, tomei várias penalidades nos radares por não prestar atenção nos trechos, acenava para todos e tentava dar atenção ao público. Era muita gente ao longo do trecho assistindo. Todos os quilômetros percorridos me enchiam de orgulho. Olhando na planilha faltavam 700 metros. Dali para frente o coração acelerou forte a emoção bateu novamente. Passei a linha de chegada estavam lá meu mecânico e amigo Luiz, meu amigo Pona e a imprensa. Desci da moto, ajoelhei para agradecer e gritava orgulhoso: – “Eu terminei meu primeiro Sertões!” Foram longos 25 km até o arco de chegada na Usina de Itaipu. Lá esperei a equipe para subirmos juntos e soltarmos novamente o grito de vitória. Muitos dos novos amigos e torcedores vieram me parabenizar. Todos torciam pelo “grandão” aqui terminar o Rally de CRF 230 sentindo-se motivados e capazes para realizar o mesmo. 

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Da esquerda para a direita:  Alexandre, Pona Miasaki, Júlio Zavatti (Bissinho) e Luiz Moretto na chegada à Usina de Itaipu.

Créditos da foto: Marcelo Machado.

Emoção de terminar um Rally? Não tem como descrever. Só quem deseja muito e sonha em estar lá para saber como é isto! A dica que dou? Vai! Vale cada centavo gasto!

Que venha 2016! Jalapão! Lutar para estar lá novamente.

Escrito por: Alexandre Durigan

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