Blog do Lawrence | A vida dura do Salmão
Definitivamente, eu não queria ter nascido salmão. Muitas vezes reclamamos da vida, mas comparada a desse peixe, nossa vida é uma moleza sem fim…
Na Ilha de Vancouver, no Canadá, tive a missão de gravar parte do ciclo de vida desse peixe tão especial. Voltei impressionado.
Para quem não sabe, o salmão nasce em cabeceiras de rios onde seus pais desovam. Passam a primeira fase de sua vida em água doce até que crescem o suficiente e migram para o oceano.
Lá, passam entre um a sete anos (dependendo da espécie), até se desenvolverem e retornarem pro mesmo local em que nasceram para reproduzir… e morrer.
Durante seu ciclo nos oceanos, os salmões são como fantasmas: rápidos, ariscos e praticamente invisíveis.
Embora os mergulhadores praticamente nunca os vejam, salmões enfrentam diversos predadores, como tubarões, orcas, leões marinhos e principalmente nós, humanos, em modernos barcos de pesca.
Os que tiverem sorte e habilidade suficientes para sobreviver, se reúnem nos estuários para sua maior aventura…
Um dramático espetáculo da natureza que representa uma das mais belas interações entre floresta e oceano: A corrida do salmão.
E documenta-la era meu maior objetivo no Canadá !
Minha aventura começou em Port Hardy, no norte da Ilha de Vancouver, onde gravamos a concentração de salmões no estuário.
Eles esperam a maré correta pra sair do mar e iniciar sua migração por água doce.
Nesse momento, o animal está “borbulhando” de energia, como mostram os saltos espetaculares que eles “ensaiam” no mar… em breve esses saltos serão fundamentais para vencer corredeiras e cachoeiras.
Uma vez que a migração começa, a vida do salmão vira um “videogame” com fases cada vez mais difíceis, as quais eu, sadicamente, me deliciei em filmar…
Desconsiderando os elementos humanos (pescadores de todos os tipos estão presentes em todas as fases que descreverei, mas não os filmei), o primeiro grande obstáculo são os ursos cinzentos (grizzlies).
Fui a Great Bear Rain Forest (como o próprio nome diz, local ideal pra encontrar grandes ursos), onde o biólogo americano Tom Rivest construiu um alojamento e plataformas de observação na beira do rio.
No local, centenas de ursos se concentram em diferentes sessões do rio para se fartar de tanto comer salmão.
Estive lá no fim da temporada, quando adultos já se fartaram e mães com filhotes são abundantes, já que os jovens ursos precisam da carne de salmão para crescer e acumular energia para sua primeira hibernação.
Nesse período, os ursos estão tão focados no salmão que nos ignoram a ponto de eu ter chegado apenas 5 metros de distância de uma mãe com dois filhotes…
Aos salmões que escapam de ursos, águias e lobos, a próxima fase é vencer corredeiras e cachoeiras.
Fui até Port Alberni, na região central da Ilha, para filmar algumas das mais impressionantes corredeiras que um salmão pode vencer…
Não tenho palavras para descrever o que vi, as fotos falam por si, mas estar lá, presenciando a força das águas e o poder dos saltos dos salmões, deu outro sabor a cada pedaço de sashimi que degusto…
Os vencedores chegam exaustos as cabeceiras dos rios… Nesse momento consumiram tanta energia que sua carne – já sem nenhuma gordura – esta apodrecendo… nessa fase são impróprios para o consumo humano.
Num último esforço, os sobreviventes procuram parceiros para desovar… mas não tranquilamente.
Ursos negros e outros carniceiros, como águias e gaivotas, aproveitam o banquete grátis e se esbaldam.
Gravando esse momento tive um encontro emocionante… estava numa pinguela, uma tábua que servia de ponte, filmando o acasalamento dos salmões, quando um urso preto se aproximou da ponte.
Tive de “pedir licença” conversando com ele e pedindo para ele abrir caminho… quando de repente vejo um filhote.
Era uma mamãe apenas 3 metros de mim… um movimento curioso do filhote na minha direção poderia deflagrar um ataque (tecnicamente defesa) fatal.
Por sorte mantive a calma, o filhote subiu numa árvore e a mamãe se colocou em posição de defesa.
Me afastei lentamente, sem perder a chance de filmar e fazer umas fotos…
Finalmente, após desovar, os salmões partem pro descanso eterno… e nessa fase também são essenciais, pois sua carne em decomposição nutre insetos, bactérias e plantas…
Não disse que a vida do salmão é dureza!